6 de abril de 2013
Resenhas

Vlado Herzog e a distensão da Ditadura

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No dia 31 de março de 1964, tropas do Exército foram às ruas para evitar uma guerra civil em alguns estados brasileiros. O presidente eleito, Jango, fugiu para o Uruguai, e naquele dia começaria a tomada do poder pelos militares no governo do Brasil — período que seria conhecido como os anos de chumbo: duas décadas de puro obscurantismo. Apoiados pelos EUA, os militares, junto com as classes conservadoras, justificaram o golpe com o argumento de que queriam evitar uma ameaça comunista.

Os militares passaram a decretar Atos Institucionais. O primeiro deles foi promulgado no dia 9 de abril de 1964: o AI-1. Esse ato cassava os direitos dos opositores ao regime militar e retirava a estabilidade dos funcionários públicos. O pior dos decretos foi o AI-5, promulgado em 13 de dezembro de 1968, durante o governo do general Costa e Silva. O AI-5 cassava mandatos, aposentava juízes à revelia, dava plenos poderes ao presidente e fortalecia a repressão a quem se opusesse à ditadura.

Em 1974, o general Ernesto Geisel assumiu a presidência prometendo uma abertura política que levaria à volta da democracia, mas as coisas não aconteceram dessa forma. No início de outubro de 1975, uma série de jornalistas foi presa, acusada de praticar subversão ou de pertencer a alguma organização contra a ditadura, principalmente o PCB. Um desses jornalistas foi Vladimir Herzog. Preso, torturado e assassinado nos porões do DOI-CODI paulista, ele se apresentou voluntariamente para um interrogatório no dia 25 de outubro. Herzog tinha 38 anos, era casado com a publicitária Clarice Herzog e pai de dois filhos.

Vlado foi encontrado morto numa sala do DOI-CODI em São Paulo. Pendurado por um cinto no pescoço, os militares sustentaram a versão de que ele havia se suicidado — versão rejeitada por amigos, familiares e pelo Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, presidido na época por Audálio Dantas. O Sindicato teve papel fundamental na desconstrução da narrativa oficial. Herzog era militante do PCB.

A morte de Vladimir Herzog deu início a um processo de distensão do regime. Ali começava a queda da ditadura. Em 27 de outubro de 1978, o jovem juiz Márcio José de Moraes responsabilizou a União pela prisão ilegal e pela morte de Herzog. Afirmou o juiz em sua sentença:

“(…) bem como há revelações veementes de que teriam sido praticadas torturas não só em Vladimir Herzog, como em outros presos políticos nas dependências do DOI-CODI do 2º Exército. Veja-se a respeito — esclareceu o juiz — os pungentes depoimentos das testemunhas Gildásio Westin Cosenza, George Duque Estrada, Gofredo da Silva Telles Júnior, Antony de Christo, Paulo Sérgio Markun, Sérgio Gomes da Silva, Luís Weiss e a declaração extrajudicial prestada por Rodolfo Konder.”

Em 15 de março de 2013, enfim, a família de Vladimir Herzog recebeu o atestado de óbito com a seguinte versão: “decorrência de lesões e maus-tratos sofridos durante interrogatório em dependência do II Exército (DOI-CODI).” Como todos sabiam, Vladimir Herzog não havia tirado a própria vida, como foi sustentado durante anos. Segundo Clarice Herzog, a batalha continua. Agora, o objetivo é saber quem matou — não apenas Vlado, mas também as outras vítimas da repressão.

Agora cabe investigar, e o Estado terá que fazê-lo. É nesse ponto que entra a participação do atual presidente da CBF, José Maria Marin, que, com um aparte ao texto do jornalista Cláudio Marques, cobrava do governo de São Paulo providências quanto às denúncias feitas por Marques ao departamento de jornalismo da TV Cultura, onde Vlado trabalhava na época.

Infelizmente, o tempo da ditadura no Brasil é triste, covarde e, por vezes, penoso de revirar. Porém, não podemos virar as costas para a nossa história — por mais obscura que ela seja. A morte de Vladimir Herzog, como a de tantos outros, não foi em vão. Disso temos certeza.

Tulio Rodrigues
Foto: Divulgação/Instituto Vladimir Herzog

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